quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O menino e o rádio.

Sua ansiedade era notável. Faltava pouco para terminar sua lição, mas o fato de precisar caprichar na caligrafia só fazia com que perdesse mais tempo.
Na velha cadeira de balanço, sua mãe mantinha um olho no tricô e outro nele. Sua vigilãncia era tão intrusiva que por vezes ele imaginara se ela desconfiava de algo.
Costurando pela décima vez o solado dos velhos sapatos, seu pai vez por outra deixava escapar um ou dois palavrões, no que era imediatamente repreendido pela esposa.
_Não fale assim na frente do garoto! Quer que ele cresça com expressões de animal?
Finalmente! Terminada a lição, mal podia esconder o suor em suas mãos.
_Mamãe, já terminei. Posso ir deitar-me?
_Traga aqui, quero conferir.
Minuciosamente, sua mãe corria os olhos pela folha do caderno.
Tinha certeza que estava perfeita. Esforaçara-se bastante para sempre ser o melhor aluno de sua classe, chegando inclusive a sacrificar as tardes de brincadeiras com os amigos na rua para enterrar-se nos livros. Colher os frutos do esforço além de gratificante, havia tornado-se uma obrigação. Mantendo-se como aluno e filho exemplar, seus pais não o ameaçariam de tirar-lhe seu bem mais precioso: Um velho rádio de segunda mão comprado como presente da aprovação escolar no ano passado e que sintonizava apenas duas estações.
_Muito bom, vejo que melhora a cada dia. Vá se banhar e depois pode dormir. Não esqueça suas orações viu?
_Obrigado mamãe. Sua benção. Sua benção papai.
No banho, podia sentir o quanto seu corpo estava quente. Suas pernas tremiam de ansiedade e nervosismo. Todas as noites o ritual era o mesmo: banhava-se, perfumava-se, ajeitava bem os cabelos, vestia seu pijama e corria para a cama, não sem antes sintonizar seu programa perferido: A noite dos namorados.
Sua mãe sempre deixava que ele ouvisse um pouco de música antes de dormir.
Deitado de bruços, ele olhava fixamente para o rádio. A primeira música, a abertura do programa, havia terminado. Foi com um brilho nos olhos e o coração acelerado que ele ouviu a voz pela qual esperara todo o dia. O locutor do programa iniciara mais uma noite de belas poesias e músicas de amor.
_ "A noite cai misteriosa
E teus olhar brilhante é tudo que vejo;
Sentindo em teus cabelos o aroma da rosa
Me inebrio na paixão e no sabor de teu beijo."
_Uma boa noite para você que sonha acordada com o homem amado...
Imaginando que aquela voz sussurrava em seus ouvidos, ele adormeceu. Em seus sonhos via-se como formosa donzela, sentada em um banco da praça com os cabelos brilhantes refletindo o luar. A chegada de seu amado causara um pequeno susto e, quando este pegava sua mão, tímida olhava para o outro lado. Logo ele tocaria suavemente seu queixo voltando seu rosto para que seus olhos se encontrassem e a beijaria delicadamente nos lábios.
O rádio agora chiava, o programa terminara e a programação da emissora encerrava-se.
Sua mãe entrava vagarosamente no quarto, desligara o aparelho e puxara melhor a coberta para cobrir-lhe todo o corpo.
Com um sorriso feliz em seus lábios, ele abraçara mais o cobertor achando ser os braços do homem da rádio, o homem amado.
Os braços de seu primeiro amor.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Homofobia silenciosa.

Dei-me conta de algo hoje e não poderia deixar de registar isso. Acho importante que fique arquivado aqui.
Há alguns dias que percebi o distanciamento de um amigo, que inclusive excluiu-me de seu orkut e não me respondia no msn, além de ter bloqueado seus recados após eu ter enviado uma indagação do porquê da exclusão, a qual obviamente não tive resposta.
Lembrei-me então de um fato comum na vida gay, mas que por parecer inofensivo e ser feito "na surdina", por muitas vezes passa despercebido. Denominei-o então de "homofobia silenciosa".
Quem nunca teve um caso desse em sua vida? Quem nunca percebeu o distanciamento mudo de um amigo ou de um familiar após saberem da sua condição sexual?
Aqueles que se distanciam agem de forma tão sorrateira que mal nos damos conta. Quando eu era mais jovem, eles simplesmente sumiam, cessavam o contato comigo. Agora, em tempos internéticos, fui excluído do orkut e me restou o silêncio branco de uma página sem diálogo no msn.
O que me incomodou não foi nem tanto o fato de ele ter me excluído de seu mundo, nós nem éramos assim tão amigos.
O incômodo maior foi ele ter tomado as dores de um fulano seu amigo, o qual eu espiei o perfil algumas vezes. Qual o medo deles? Que mal eu poderia causar?
Por que tanto incômodo por parte do dono do perfil, se eu apenas olhei?
Sei que meu espaço termina onde começa o do outro, mas em momento algum julguei-me desreipeitoso, visto que olhar não é pecado, muito menos proibido.
Infelizmente esse tipo de homofobia pouco ou nada pode ser feito contra, porque simplesmente não podemos exigir que alguém nos queira bem.
Depois de tudo eu apenas me pergunto: Errei eu, ou teria errado você?

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Meu 1° conto.

O relógio marcava exatamanente 13:00h da tarde, e eu ansioso, não via a hora de meu ônibus chegar à cidade de meus avós.

Mais uma vez voltava aquela cidade tão querida... Cidade onde crescí, onde corria descalço pelas ruas, onde jogava bola no campinho de terra, onde tomava banho nos rios. Porém, dessa vez eu não voltara pelo mesmo motivo de sempre, havia algo mais, algo que me inquietava e me fazia querer descer do ônibus e correr mais rápido que ele; enfrentar aquela chuva que caía e a distância que ainda me separava dele.

Sim, ele... A força que me movia naquele instante, algo até então desconhecido para mim que, aos 17 anos, experimentava pela primeira vez a densidade e a magia do primeiro amor.

Desde o momento que o conhecera não haviam mais conflitos nem duvidas. Seu sorriso trouxe consigo a verdade que eu precisava, o esclarecimento de que o amor jamais poderia ser pecado, jamais poderia ser errado.

Minha ansiedade era tamanha que não podia controlar meus sorrisos. Olhava para a chuva lá fora e sorria livremente, imaginando como seria nosso primeiro encontro de amor. Haviamos marcado no 'Pontilhão', uma ponte abandonada que dava acesso à serra do 'Torreão', ponto turístico da pequena cidade do interior.

De repente o medo tomou conta de mim!

E se eu não chegasse na hora marcada? E se ele achasse que eu não iria e fosse embora?

Comecei então a rezar, e a pedir a Deus que não me tirasse aquele momento.

Finalmente o ônibus chegara e eu ja me encontrava em casa de meus avós, a chuva havia amainado e após todos os cumprimentos, troquei de roupa apressadamente e sai dizendo que precisava resolver algo urgente. Precisava chegar la o mais rapido possivel!

Ao chegar ao pontilhão, ao longe pude vê-lo. Deus! Como estava lindo. Meu coração saltou e após me receber com um sorriso ele disse:

_Que bom que você veio! Vamos antes que a chuva recomece?

Caminhando a seu lado parecia que nada mais existia, nem mesmo a chuva que recomeçara tinha importância... Estávamos molhados, mas o calor de nossos corações era suficiente para que nada fosse maior que aquele momento.

Então, chegamos ao local marcado.

Deus parecia mesmo estar abençoando aquele momento. A serra estava mais linda que nunca, o inverno chegara e a vegetação nos saudava com todo seu esplendor e beleza.

Subimos mais um pouco a serra e quando tivemos certeza que ninguem poderia nos ver, sabiamos que havia chegado o momento. Ele se colocou à minha frente e eu pude olhá-lo como jamais havia feito... Seus olhos verdes brilhavam de ansiedade, seu queixo tremia de frio e seus cabelos molhados lhe davam um aspecto de moleque travesso.

Ele pegou minhas mãos e chegou mais perto, sentia o calor que vinha dele. Suas mãos tremiam ao segurar as minhas, e ao me abraçar, ele sorriu ao sentir minhas pernas bambas. Me abraçou com delicadeza e eu me acheguei à seu peito, descansei a cabeça em seu ombro e relaxei. Então, chegou o momento... Sem palavra sequer ficamos frente à frente, ele me olhou momentos antes de fecharmos os olhos e então aconteceu. Nossas bocas se uniram em um beijo cândido e terno... Sem pressa, sem violência, sem medo.

Apenas sentimento.

Naquele momento o tempo parou de passar, o vento já não soprava e a chuva simplesmente parou no meio do caminho entre os céus e a terra.

Éramos apenas nós dois nos tornando um só.

Éramos apenas amor, e naquele momento parecia não haver o depois. Também não lembravamos se houvera um antes, e isso simplesmente já não importava.

Nada aconteceu naquele dia após aquele beijo. Não houve sexo, nem outro beijo.

Nossas almas estavam satisfeitas e não era preciso mais nada.

No caminho de volta, alimentando nossos sonhos, acreditamos na utopia de sermos felizes para sempre juntos... Dois garotos que se tornavam homens.

Ao descermos a serra sentimos a chuva, e a tristeza das lágrimas do céu trouxe a certeza que o depois viria sombrio, como sombria é a vida dos iguais que amam diferente.

Nos despedimos com um olhar e seguimos nossos rumos... mais algo ficou lá naquela serra, algo de uma força tão tremenda que nos segundos eternos de um beijo, fez o tempo parar de passar, o vento parar de soprar e a chuva parar de cair.

Olá gente boa.

Esse é meu primeiro blog e, consequentemente, a primeira vez que exponho meu trabalho publicamente.
Não criei este espaço para divulgar o que escrevo apenas, isso seria leviano.
Abri meu 'caderno virtual' para que outros que como eu vêem beleza em momentos simples da vida e, com um pouco de imaginação e criatividade, conseguem transpôr sentimentos em palavras.
Derramo aqui tudo de minh'alma inquieta e sedenta de boas vibrações. Exponho o que sou e o que sinto nas letras que em torrente, escorrem incolores, para ganharem forma e entendimento nos pensamentos daqueles que por ventura abriram os ouvidos de seus corações aos gritos do meu.
O blog não tem temática específica, porém meus textos são voltados quase que em totalidade à vida homossexual.
Que aqui seja um lugar onde você possa informar-se, divertir-se, emocionar-se ou apenas passar o tempo.

Carpe diem.